Abuso Sexual em Nome do Amor

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Abuso Sexual em Nome do Amor

ABUSO SEXUAL EM NOME DO AMOR

 Introdução

     Abuso sexual em nome do amor foi o que aconteceu com Amnon e Tamar, conforme registro dramático encontrado na Bíblia. Aconteceu no ambiente doméstico, tendo como pano de fundo a intimidade familiar e sendo consumado através da manipulação emocional de Amnon, conforme relato no livro de II Samuel 13.1-18. O abusador declarou que “amava” a vítima. O abusador estava obcecado perla vítima, a ponto de “angustiar-se até adoecer”. O abusador considerou a vítima apenas como objeto sexual, pois “usou e descartou em seguida”. O fato aconteceu mesmo que a vítima tivesse dito “não” insistentemente e até argumentasse com vários motivos.

      O fato ocorrido foi narrado pelo escritor bíblico, da seguinte maneira, na linguagem atualizada, inclusive usando a expressão “estar apaixonado”: “Depois de algum tempo, Amnom, filho de Davi, apaixonou-se por Tamar; ela era muito bonita e era irmã de Absalão, outro filho de Davi. Amnom ficou angustiado a ponto de adoecer por causa de sua meia-irmã Tamar, pois ela era virgem, e parecia-lhe impossível aproximar-se dela. Amnom tinha um amigo muito astuto chamado Jonadabe, filho de Siméia, irmão de Davi. Ele perguntou a Amnom: “Filho do rei, por que todo dia você está abatido”? Quer me contar o que se passa?” Amnom lhe disse: "Estou apaixonado por Tamar, irmã de meu irmão Absalão". Então disse Jonadabe: "Vá para a cama e finja estar doente". "Quando seu pai vier visitá-lo, diga-lhe: Permite que minha irmã Tamar venha dar-me de comer. Gostaria que ela preparasse a comida aqui mesmo e me servisse. Assim poderei vê-la".  Amnom atendeu e deitou-se na cama, fingindo-se doente. Quando o rei foi visitá-lo, Amnom lhe disse: "Eu gostaria que minha irmã Tamar viesse e preparasse dois bolos aqui mesmo e me servisse". Davi mandou dizer a Tamar no palácio: "Vá à casa de seu irmão Amnom e prepare algo para ele comer". Assim, Tamar foi à casa de seu irmão, que estava deitado. Ela amassou a farinha, preparou os bolos na presença dele e os assou. Depois pegou a assadeira e lhe serviu os bolos, mas ele não quis comer. Então Amnom deu ordem para que todos saíssem; depois que todos saíram, Amnom disse a Tamar: "Traga os bolos e sirva-me aqui no meu quarto". Tamar levou os bolos que havia preparado ao quarto de seu irmão. Mas quando ela se aproximou para servi-lo, ele a agarrou e disse: "Deite-se comigo, minha irmã". Mas ela lhe disse: "Não, meu irmão! Não me faça essa violência. Não se faz uma coisa dessas em Israel! Não cometa essa loucura. O que seria de mim? Como eu poderia livrar-me da minha desonra? E o que seria de você? Você cairia em desgraça em Israel. Fale com o rei; ele deixará que eu me case com você". Mas Amnom não quis ouvir e, sendo mais forte que ela, violentou-a. Logo depois Amnom sentiu uma forte aversão por ela, mais forte que a paixão que sentira. E disse a ela: "Levante-se e saia!" Mas ela lhe disse: "Não, meu irmão, mandar-me embora seria pior do que o mal que você já me fez". Ele, porém, não quis ouvi-la e chamando seu servo, disse-lhe: "Ponha esta mulher para fora daqui e tranque a porta". Então o servo a pôs para fora e trancou a porta. Ela estava vestindo uma túnica longa, pois esse era o tipo de roupa que as filhas virgens do rei usavam desde a puberdade. Tamar pôs cinza na cabeça, rasgou a túnica longa que estava usando e se pôs a caminho, com as mãos sobre a cabeça e chorando em alta voz”.

 Conceituação

      A expressão abuso sexual tem sido definida como atos de relacionamento sexual quando não há permissão ou concordância de uma das partes envolvidas. Geralmente o agressor usa força, faz ameaças, recorre à chantagem, apela para manipulação psicológica, declara amor. Ocorre através de pessoas que desfrutam de posição de poder e autoridade, proximidade relacional, confiança conquistada, oferta financeira e outras vantagens, sendo registrada nos mais variados ambientes: familiar, profissional, escolar e outros afins[1].

         No Brasil, o abuso sexual foi objeto de legislação através da Lei 12.015/2009, que integra o Código Penal, cujo objetivo imediato é inibir o acontecimento e, caso exista, punir o infrator, a partir das denúncias que sejam feitas. Infelizmente, mesmo existindo a lei e os órgãos competentes, parte das vítimas não faz denúncia, justificando o silêncio no medo de represálias posteriores, vergonha de exposição pública, sensação de impunidade cultural, demora na condenação dos infratores. Estão incluídos nessa classificação o estrupo, o aliciamento e exploração, o assédio e a importunação.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, foram registrados 74.930 estupros, o maior número da história, e 61,4% das vítimas tinham no máximo 13 anos de idade, com um crescimento de 8,2% em relação ao ano anterior. Foram registrados 68,3% na residência da vítima, 9,4 em vias públicas e 22,0% em outros ambientes. De acordo com os registros, 88,7% foram contra pessoas do sexo feminino e 11,3% contra pessoas do sexo masculino[2]. 

 2. Amor e Paixão

      Sem ignorar as várias causas já relacionadas nos estudos de casos, que motivam os agressores a abusar sexualmente de pessoas, inclusive psicológicas, psiquiátricas e éticas, bem como reconhecendo que o fato existe desde os tempos antigos, não se pode ignorar, todavia, que os intensos estímulos sexuais da sociedade contemporânea mexem com a química do corpo humano, em nome da liberdade dos impulsos, assim como não se pode ignorar a atitude de confundir amor e paixão nos relacionamentos, conforme ocorreu na história de Amnon e Tamar.  A declaração de amor está presente na história, sendo interpretada também como paixão e se tornou a razão apresentada para o estrupo. O fato de o relato declarar que ele “adoeceu de amor”, isto é, viveu uma experiência psicossomática, revelou que ele estava realmente tomado por uma paixão. O fato de ele a ter expulsado imediatamente de sua vida mostrou que não a amava.

      Isto significa, que às vezes, muitas pessoas pensam que estão amando quando na verdade estão dominadas por uma paixão irresponsável e leviana, cujas caraterísticas são sintomas físicos alterados, confusão mental, efemeridade. Essa efemeridade, quer dizer que tem prazo de existência, pode ser sucedida por outras logo em seguida e não se apega a nenhuma pessoa. Como experiência emocional, é resultado de reações químicas do organismo, sob efeito de estimulação sexual. O outro é visto apenas como objeto sexual a ser usado, uma ou várias vezes, até que seja descartado.

     Em reportagem publicada há algum tempo sobre o assunto, o autor escreveu: “Havendo interesse por outra pessoa, a química rola com substâncias que provocam sintomas intensos e avassaladores em todo o corpo. Os mais evidentes são o aumento da pressão arterial, da frequência respiratória e dos batimentos cardíacos, a dilatação das pupilas, os tremores e o rubor, além da falta de apetite, concentração, memória e sono. Uma das responsáveis pelas descargas de emoções para o coração e as artérias é a dopamina, um neurotransmissor da alegria e da felicidade liberado no organismo para potencializar a sensação de que o amor é lindo”[3]. Há uma descarga de hormônios que explicam a paixão: dopamina, adrenalina, cortisol, ocitocina, vasopressina, endorfinas.

      Diferentemente da paixão, que é uma experiência emocional, o amor é um sentimento duradouro, equilibrado, responsável, solidário, cuidador. Comentando a diferença entre ambos, o Professor de Filosofia Pedro Menezes escreveu: “O amor é um sentimento mais profundo, duradouro e estável baseado numa relação de reciprocidade e cuidado com a pessoa amada. O amor tem seu significado relacionado ao cuidado de si e do outro. O amor representa uma relação de proximidade, afeto e preservação”[4]. Seus componentes são: empatia, compreensão, cuidado, estabilidade, segurança, interdependência. Numa interpretação cristã, o sentimento tem sua origem na expressão do espírito que constitui o ser humano, além do corpo, com suas reações químicas. O amor é, portanto, uma expressão espiritual da personalidade. Quando o amor vem acompanhado pela paixão a experiência é construtiva. Quando a paixão vem sem a companhia do amor, a experiência é destrutiva.

 Conclusão

Acontecendo o abuso sexual, o violentador geralmente sai da experiência sem qualquer arrependimento, remorso ou sentimento de culpa, pouco se importando com a vítima e com as consequências em sua vida, pronto para novos casos, principalmente se for diagnosticado como sociopata ou com outros transtornos da personalidade. A vítima, por outro lado, sofre lesões físicas, morais, psicológicas, sociais para o resto da vida, tornando-se sujeita a vários distúrbios alimentares, escolares, familiares, relacionais, sentimentais, sexuais, existenciais. Seja de maneira imediata ou em médio prazo, os prejuízos sobre a personalidade e a convivência social serão inevitáveis, deixando a vítima necessitada de assistência terapêutica e principalmente espiritual, além de ter condições para vivenciar uma verdadeira experiência de amor.

 

Autor: Edson Raposo Belchior

 

Bibliografia

ARAÚJO, Ana Paula. Abuso: A Cultura do Estupro no Brasil. São Paulo, Globo Livros, 2020.

DOBSON, James. Dr. James Dobson Fala Sobre. S. Paulo, Editora Vida, 1980.

NEGREIROS, Adriana. A Vida Nunca Mais Será a Mesma. Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2021.

PINHEIRO, Carla. A Ferida do Abuso e o Balsamo do Ceu. Caldas Novas, Produções Cevi, 2024.

 

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Abuso_sexual

[2] https://www.andes.org.br/conteudos/noticia/crescem-casos-de-violencias-contra-mulheres-criancas-e-adolescentes-no-brasil1#:~:text=Em%20rela%C3%A7%C3%A3o%20a%202021%2C%20a,ocorreram%20na%20resid%C3%AAncia%20da%20v%C3%ADtima.

[3] https://super.abril.com.br/comportamento/a-quimica-da-paixao

[4]https://www.diferenca.com/amor-e-paixao/#:~:text=Qual%20a%20diferen%C3%A7a%20entre%20amor,impulsos%20sexuais%20e%20o%20prazer.